Elos Clube de Tavira

Fevereiro 19 2011

  (*)

 

 Glória Marreiros

 

ERA NOVA

 

Desponta a Primavera, em meu regaço,

Com odores de vida e de esperança.

As andorinhas trazem confiança

À magia do sonho, onde me enlaço.

 

Partiu o melancólico cansaço

Que eu trazia, de outrora, como herança.

Agora as madressilvas são pujança,

Em braçadas de luz no meu espaço.

 

Açudes, onde a água é cristalina

Lavam tempos antigos, outra sina,

Regam o despertador da nova era.

 

O tempo que vivi não volta mais,

Mas voltam rosas brancas nos beirais,

E volta, em cada ano, a Primavera!

 

 _____________________________________________________________________

 

Maria da Glória Duarte Marreiros José nasceu em Monchique onde passou a infância e parte da juventude, mas viria a fixar a sua residência em Portimão.

A forma dos seus poemas envolve melodias que não ferem, antes encantam os sentidos em névoa de sonhos que convidam à observação da natureza e das belezas que ela contém. Em 1988 publicou o seu primeiro livro “Rochedo de Solidão”, continuando a produzir poesia, que dispersou por vários jornais e concorrendo a muitos certames literários. Mas continuou também a publicar livros onde reuniu os seus poemas. Casos de “Dançar na Tempestade”(1993), “Embalar a Mágoa”(1996), “Silêncio do Riso”(1998), “Terra de Ninguém”(2004), “Emoções em Terra Doce”(2008) e “Bailados Secretos em Noite de Luz”(2009).

Com o seu livro “Colar de Pérolas” (2006), ganhou o Prémio Literário Paul Harris, em concurso no âmbito dos países de língua portuguesa.

 

 Luís Horta

Presidente da Mesa da Assembleia Geral do

Elos Clube de Tavira

 

(*)http://www.google.pt/imgres?imgurl=http://www.joaquimevonio.com/espaco/gloria_marreiros/Gloria-9.jpg&imgrefurl=http://www.joaquimevonio.com/espaco/gloria_marreiros/gloriamarreiros.html&usg=__CZBnAOriiHGDh8iCgKu6VokQf98=&h=953&w=740&sz=118&hl=pt-pt&start=0&zoom=1&tbnid=AXi9eUN0x9Q5oM:&tbnh=127&tbnw=97&ei=b4JfTfrzOILh4wb6pu3VCQ&prev=/images%3Fq%3DGl%25C3%25B3ria%252BMarreiros%26um%3D1%26hl%3Dpt-pt%26sa%3DN%26biw%3D1007%26bih%3D681%26tbs%3Disch:1&um=1&itbs=1&iact=hc&vpx=117&vpy=41&dur=281&hovh=255&hovw=198&tx=115&ty=118&oei=9YFfTYuNA9TogAff9si4AQ&page=1&ndsp=20&ved=1t:429,r:0,s:0

publicado por Henrique Salles da Fonseca às 08:30

Fevereiro 17 2011

 Fonseca Domingos

 Fonseca Domingos

 

EUREKA

 

Bem cedinho, no campo, fujo à cama,

Um assobio acorda a madrugada,

Persigo uma certeza, que proclama

Um rio de primavera, na alvorada

 

Um mar de luz e fogo se derrama,

Ao longe, sobre a serra incendiada,

Enquanto espreito o Sol, como quem ama,

De entre o tomilho e a urze perfumada:

 

De bruços sobre a minha terra amada,

A alma embevecida, deslumbrada,

Lembro risos difusos, na distância;

 

Na fusão do Presente e do Passado,

Sinto dentro de mim o olvidado

Paraíso perdido da infância!

 

_________________________

 

José Maria da Fonseca Domingos, (1936-2002). Natural de São João da Venda, Almancil, concelho de Loulé emigrou aos 18 anos para a Venezuela onde conheceu a obra de Ruben Dario e Alfonsina Storni. Para além disso, era admirador de Pablo Neruda e Bocage.

 

Regressado a Portugal, ingressou no Ministério da Segurança Social, trabalhando na área administrativa, mas nunca deixando de escrever.

 

Em 1987 começou a concorre regularmente a certames literários, tendo sido distinguido em Portugal e no Brasil, contando mais de duas centenas de prémios. Tem trabalhos seus em diversas colectâneas, nomeadamente nas áreas da poesia e do conto. Publicou seis livros de sonetos e outros poemas, incluindo humorísticos. Tem dois livros inéditos, um deles de contos e vários poemas na Internet. Foi membro da AJEA, ASORGAL e da AIRA (associações de jornalistas e escritores).

 

Faleceu em 09 de Dezembro de 2002, vítima de doença incurável.

 

LUís Horta.jpg Luís de Melo e Horta

Presidente da Mesa da Assembleia Geral do

Elos Clube de Tavira

publicado por Henrique Salles da Fonseca às 08:57

Janeiro 15 2011

 Fernando Laginha

 Fernando Laginha

 

Que fizeste do tempo?

 

Que fizeste do tempo? Onde perdeste

A lembrança de tanto que lembrar?…. 

… A mágoa breve que te fez chorar,

Pequenas alegrias que tiveste,

……………………………………

As coisas que escutaste e que disseste,

Horas de tédio, esperanças que alcançar.

Segredos soluçantes ao luar,

Manhãs de sol!…os gestos que fizeste.

……………………………………

Que conta dás do tempo? À tua frente

O infinito e o medo pertinente

Do dia que há-de vir. Atrás, perdida,

……………………………………

Toda uma vida que mal enche agora

Os sessenta minutos de uma hora

Nos sessenta segundos de uma vida….

 

 

****

 

Eu

 

Passa gente por mim que eu não conheço,

Que a vida empurra para fins diversos.

Fogachos rutilantes e dispersos

Desta mesma fogueira em que arrefeço.

 

Cruzam-se em mim, – que estranho lhes pareço –

Seus caminhos distantes e reversos.

Falam as suas vozes nos meus versos

De outros versos sem fim e sem começo.

 

Assim me sinto alheio de meus passos,

Resquício de outros risos e cansaços,

- Sol de outro sol e sede de outra sede.

 

Assim, tudo anda em mim e eu ando em tudo… S

ou grito em cada grito, antigo e mudo,

E pedaço de pão na mão que pede!

 

____________________________

 

Fernando Laginha Ramos (Loulé, 21.Abril.1918; Lisboa, 03.Novembro.1974) foi um poeta autodidacta. Comerciante da área da ourivesaria, teve uma actividade literária algo discreta. Mas os seus versos implicam conceitos e sentimentos que, se em época mais recente o poeta houvesse vivido, teriam decerto encontrado maior eco e merecido outra divulgação.

 

Das duas produções aqui inseridas se pode aquilatar da serenidade da mensagem, através de um conseguido equilíbrio estrutural, em agradável sonoridade.

 

Foi amigo e protector de António Aleixo, tendo-o apresentado a Tossan (António Santos), o artista plástico que haveria de levar o Poeta popular ao contacto com o Dr. Joaquim Magalhães, que o “empurrou” para a reunião da obra.

 

Fernando Laginha era um homem dividido entre o aspecto prático do seu dia-a-dia e o gosto pela poesia. Limitava-se a concorrer a diversos Jogos Florais (onde quase sempre arrebatava um prémio) e nunca pensou publicar os seus versos.

 

Faleceu com 56 anos. E a família, para evitar que a memória se perdesse, reuniu uma parte da sua obra em livro, publicado trinta anos depois e intitulado “Poemas – Fernando Laginha”.

 

LUís Horta.jpg Luís de Melo e Horta

Presidente da Mesa da Assembleia Garal do

Elos Clube de Tavira

publicado por Henrique Salles da Fonseca às 14:30

Janeiro 11 2011

 Maria José Guerreiro

Maria José Guerreiro Pinheiro

 

A Tavira

 

Quis separar as letras do teu nome,

Achei tão curioso e divertido…

Imaginar que cada uma tome,

Na sua independência, um bom sentido!

 

O “T” é de Trabalho, é de Ternura…

Que fazem muita falta a toda a gente;

Calmantes são de tanta desventura,

Na senda deste mundo indiferente…

 

O “A” é uma letra repetida,

Que pressupõe Amigo e Alegria;

Prelúdio do Amor, o rei da vida,

Que sem ele não pode ter valia.

 

O “V” é de Verdade e de Valor,

Alicerces bem fortes, preciosos,

Sem eles faltarão brilho e cor,

Não vingarão momentos gloriosos!

 

Com “I” s’escreve Irmão, Inteligência,

Idílio, Ideia, Igreja, Idoso, Inverno,

Também a Igualdade e Indulgência,

Sem os quais o mundo é um inferno.

 

Com “R” eu principio alegre “Riso”

Tempero dum viver bem desgastante;

Sorrir é salutar e tão preciso,

É comunicação contagiante.

 

Tavira, tudo isto tens em ti!

Cultiva sempre a flor da lealdade.

Há um pedido em tudo o qu’escrevi:

Não troques a modéstia p’la vaidade!

 

(3º. Prémio dos VI Jogos Florais do Elos C. de Tavira/1992, Modalidade Poesia dedicada a Tavira) _

 

_____________________

 

Maria José Guerreiro Pinheiro (nascida em 1940, na Freguesia de S. Clemente, concelho de Loulé e falecida em Tavira em Setembro de 1998).

 

Fez o curso liceal, matriculando-se depois na Escola do Magistério de Faro, onde obteve o grau de Professora do Ensino Básico. Depois de várias colocações por toda a Província, acabou por se radicar em Tavira onde leccionou durante os últimos anos da sua carreira profissional.

 

Era casada e teve uma filha, também ela Professora.

 

Acompanhando o seu percurso no Ensino, dedicou-se à poesia que cultivou com determinação e muito empenho, concorrendo a todos os certames literários de que tinha conhecimento, mantendo com outros poetas de Tavira, tertúlias muito interessantes pela troca de ideias em espírito comum, na constante procura pela rima mais correcta e a mensagem mais sensibilizante.

 

Nas tardes de terça-feira, a Rádio Gilão, sediada em Tavira, apoiava estes encontros com os vários cultores das artes da rima, em programa transmitido em directo, com geral agrado do público.

 

Maria José Pinheiro foi uma das participantes activas desse programa radiofónica, mesmo quando a doença já a tinha minado – e ela conhecia o seu estado de saúde – continuando também a produzir poesia, a editar livros e a participar em concursos literários.

 

______________________________________

 

Livros publicados: “Verdade e Fantasia”, “Para Ti, Criança!”, “No Jardim do Pensamento” e “Poemas de Corpo Inteiro”.

 

 Luís de Melo e Horta

Presidente da Mesa da Assembelia Geral do

Elos Clube de Tavira

publicado por Henrique Salles da Fonseca às 14:44

Dezembro 02 2010

 (*)

Gaivota

 

Transporta no bico

Esse traço fino

Entre o verde e o azul

Que separa e enleia

O espanto do menino

E um castelo de areia

Nas praias do sul

 

Leva na asa

A brisa leve

Dum final de tarde

E no seu olhar

O reflexo róseo

Da barra-poente

Que reflecte e arde.

 

Leva no peito

O branco-alvura

De pureza e paz

E em cada voo

A força e o assombro

Que um belo poema

Só ele é capaz

 

Ofélia Bomba

______________________________________

 

Maria Ofélia da Costa Oliveira Bomba Janeiro Borges nasceu em Boliqueime/Loulé, mas foi de imediato viver para Tavira onde seu pai era médico veterinário municipal. Fez nos anos 50 o curso secundário e complementar nesta cidade algarvia e aos 17 anos rumou a Lisboa a fim de frequentar a Faculdade de Medicina.

 

É médica especialista em psiquiatria, profissão que exerce no Ministério da Justiça, na área da Delinquência Juvenil e faz clínica privada.

 

Sempre se dedicou à poesia, cujos trabalhos tem publicado em vários jornais e revistas, além dos livros que subscreveu.

 

É membro da SOPEAM (Sociedade. Portuguesa de Escritores e Artistas Médicos), UMEAL (União de Médicos Escritores e Artistas Lusófonos) e da UNEM (União de Escritores Médicos) e ainda da AJEA (Associação dos Jornalistas e Escritores Algarvios). Está ainda em diversas Antologias.

 

________________

 

Livros de Poesia publicados: “Poemas do Rato Morto”/1993; “Porta de Reixa”/2001 e “Para Ti”/2004.

 

 Luís de Melo e Horta

 

(*) http://www.google.pt/imgres?imgurl=http://gaivotadaria.blogs.sapo.pt/arquivo/gaivota.jpg&imgrefurl=http://gaivotadaria.oldblogs.sapo.pt/&usg=__H_ysUkWMww9_QPs-lJLHEBPKVYY=&h=231&w=350&sz=12&hl=pt-pt&start=0&zoom=1&tbnid=NMdEaOZA-OxvAM:&tbnh=128&tbnw=164&prev=/images%3Fq%3Dgaivota%26um%3D1%26hl%3Dpt-pt%26sa%3DN%26biw%3D1007%26bih%3D681%26tbs%3Disch:1&um=1&itbs=1&iact=rc&dur=546&ei=Ovb3TPquK8eHhQfBztjGDw&oei=Ovb3TPquK8eHhQfBztjGDw&esq=1&page=1&ndsp=20&ved=1t:429,r:8,s:0&tx=108&ty=61

publicado por Henrique Salles da Fonseca às 19:31

Novembro 24 2010

  Nuno Júdice

 

  Poema

 

Como se o teu amor tivesse outro nome no teu nome,

Chamo por ti; e o som do que digo é o amor

Que ao teu corpo substitui a doçura de um pronome

- tu, a sílaba única de uma eclosão de flor.

 

Diz-me, então, por que vens ter comigo

No puro despertar da minha solidão?

E que murmúrio lento de uma cantiga de amigo

Nos repete o amor numa insistência de refrão?

 

É como se nada tivesse para te dizer

Quando tu és tudo o que me habita os lábios:

Linguagem breve de gestos sábios

Que os teus olhos me dão para beber.

 

______________________________________

 

Nuno Júdice, Poeta e Ensaísta, nasceu na Mexilhoeira Grande em 1949. Licenciou-se em Filologia Românica pela Universidade de Lisboa e foi Doutorado pela Universidade Nova, onde é Professor Catedrático, apresentando, em 1989, uma dissertação sobre Literatura Medieval.

Conselheiro Cultural da Embaixada de Portugal e Director do Instituto Camões em Paris, publicou antologias, edições de crítica literária, estudos sobre Teoria da Literatura e Literatura Portuguesa.

Divulgador da literatura portuguesa do século XX, lançou, em 1993 , Voyage dans un siècle de Littérature Portuguaise. Organizou a Semana Europeia da Poesia, no âmbito da Lisboa '94 - Capital Europeia da Cultura. Poeta e ficcionista, a sua estreia literária deu-se com A Noção de Poema (1972).

Em 1985 receberia o Prémio Pen Clube e o Prémio D. Dinis da Casa de Mateus, em 1990. Em 1994 a Associação Portuguesa de Escritores, distinguiu-o pela publicação de Meditação sobre Ruínas, finalista do Prémio Europeu de Literatura Aristeion. Assinou ainda obras para teatro.

Foi Director da revista literária Tabacaria, editada pela Casa Fernando Pessoa e Comissário para a área da Literatura da representação portuguesa à 49ª Feira do Livro de Frankfurt.

De 1972 e 2006 publicou mais de meia centena de obras, entre poesia, ensaio e ficção.

Tem obras traduzidas em Espanha, Itália, Venezuela, Inglaterra e França.

 

 Luís de Melo e Horta

Presidente da Mesa da Assembleia Geral do

Elos Clube de Tavira

publicado por Henrique Salles da Fonseca às 09:03

Novembro 09 2010

 

  

António Ramos Rosa

 

Nuvens

 

Encantei-me com as nuvens, como se fossem calmas

Locuções de um pensamento aberto. No vazio de tudo

Eram frontes do universo deslumbrantes.

Em silêncio via-as deslizar num gozo obscuro

E luminoso, tão suave na visão que se dilata.

 

Que clamor, que clamores mas em silêncio

Na brancura unânime! Um sopro do desejo

Que repousa no seio do movimento, que modela

As formas amorosas, os cavalos, os barcos

Com as cabeças e as proas na luz que é toda sonho.

 

Unificado olho as nuvens no seu suave dinamismo.

Sou mais que um corpo, sou um corpo que se eleva

Ao espaço inteiro, à luz ilimitada.

No gozo de ver num sono transparente

Navego em centro aberto, o olhar e o sonho.

 

(Volante Verde – 1986) in Antologia Poética, Selecção de Ana Paula Coutinho Mendes

 

___________________________

 

António Vítor Ramos Rosa (Faro, 17 de Outubro de 1924). Poeta e ensaísta. Viveu a sua juventude em Faro, onde estudou o secundário que não chegou a terminar.

Em 1958 publica no jornal «A Voz de Loulé» o poema "Os dias, sem matéria" e logo a seguir o seu primeiro livro «O Grito Claro», n.º 1 da colecção de poesia «A Palavra», editada em Faro, sob a direcção do também poeta Casimiro de Brito. Como Fernando Grade e outros, ambos protagonizam o movimento da moderna poesia portuguesa.

Ainda nesse ano inicia ARR a publicação da revista «Cadernos do Meio-Dia», mas em 1960 encerra a edição por ordem da polícia política. Em meados dos anos sessenta, Ramos Rosa radicou-se em Lisboa, para trabalhar na área comercial, que breve abandona para se dedicar inteiramente à poesia, desde logo publicando “Viagem Através Duma Nebulosa”.

É o poeta do presente absoluto, da «liberdade livre» e sobe todos os degraus da admiração europeia. A sua produção reflecte uma evolução do subjectivismo, em relação à objectividade, abarcando variadas tendências, desde algumas formas experimentais a um certo neobarroquismo.

Nos seus textos está ente presente uma reflexão sobre o próprio acto da escrita e a natureza da criação poética, a questão do dizível e do indizível.

Tido como um dos grandes poetas portugueses contemporâneos, tem recebido numerosos prémios nacionais e estrangeiros, entre os quais o Prémio Pessoa, em 1988.

Ramos Rosa, também tradutor, escreveu cerca de sessenta volumes de poesia. Em 2001 lançou “Antologia Poética”, com prefácio e selecção de Ana Paula Coutinho Mendes O seu nome foi dado à Biblioteca Municipal de Faro.

 

 Luís de Melo e Horta

Presidenta da Mesa da Assembleia Geral do

Elos Clube de Tavira

publicado por Henrique Salles da Fonseca às 14:31

Novembro 03 2010

Luthegarda de Caires

 

Ao voltar a Vila Real de Santo António

 

Tornei a ver-te! Agora os meus cabelos

Embranqueceram já... longe de ti.

Foram-se há muito aspirações e anelos

Mas as saudades ainda as não perdi.

 

Tantas saudades da suave infância,

Tantas saudades de ilusões perdidas!

Daquelas flores hoje emurchecidas

Cheias de seiva, outrora, e de fragância!

 

Ao recordar os sonhos que sonhei

Julgava o coração sem alento

P’ra reviver ainda o sentimento

Por todas essas cousas que eu amei!

 

Mas volto à minha terra, tão bonita!

Terra onde reina o sol que resplandece,

Aonde a vaga é murmurar de prece

E sinto ainda a ternura infinita.

 

É que não há céu de tal 'splendor

Nem rio azul tão belo e prateado

Como o Guadiana, o meu rio encantado

De mansas águas, suspirando amor!

 

________________

 

Luthegarda Guimarães de Caires, escritora e filantropa, (Vila Real de Santo António, 1873; Lisboa, 1935) perdeu a mãe ainda criança. Mas o pai rodeou-a, a ela e ao irmão, de um ambiente de grande ternura e de arte.

Ainda jovem, deixa o Algarve e passa a viver em Lisboa onde conhece e vem a casar com o advogado madeirense João de Caires, homem culto, escritor e fundador da Sociedade de Propaganda de Portugal, que reunia em casa amigos e onde havia regularmente animados serões literários. Era o ambiente propício para que Lutgarda de Caires desse livre curso à sua criatividade.

Porém, sofreu logo no início do casamento a perda de uma filha, facto que a marcou profundamente e que se revela na tristeza da sua poesia. A partir daí, decide passar a visitar as crianças doentes do Hospital da Estefânia levando-lhes roupas, brinquedos e rebuçados.

O casal Caires viveu em Óbidos e Alcobaça, onde o marido foi juiz. Nesta cidade nasceria o filho Álvaro (Guimarães de Caires), que viria a ser, além de médico, professor na Universidade de Sevilha, escritor e investigador.

Por onde passava, Lutgarda deixava uma marca de cultura e filantropia. A partir de 1905, começa a colaborar em jornais com artigos de índole social. A sua primeira obra. 'Glicínias" foi editada em 1910. Seguiram-se "Papoilas (1912) e "A Dança do Destino, contos e narrativas" (1913).

Já regressada a Lisboa, continua a visitar regularmente as crianças do Hospital da Estefânia. Os lucros que obtinha da venda dos seus livros destinavam-se a proporcionar às crianças um melhor dia de Natal.

Em 1911, o Ministro da Justiça propôs à escritora que fizesse um estudo da situação dos presos, principalmente das mulheres. Nessa época as prisões eram mistas e as mulheres estavam numa situação extremamente crítica, tanto física como psicologicamente. Lutgarda denunciou as péssimas condições em que viviam os prisioneiros e os seus artigos conseguem melhores condições higiénicas nos cárceres. Mas a sua prioridade ia para as crianças e para a escrita. A sua obra é principalmente de poesia.

Durante dez anos, Lutgarda de Caires foi a impulsionadora do Natal das Crianças dos Hospitais, hoje Natal dos Hospitais e que foi alargado a todas as idades.

 ________________

 

Livros, além dos já mencionados: "Bandeira Portuguesa" (1910); "Dança do Destino" (1911); "Pombas Feridas" (1914), "Sombras e Cinzas" (1916); o romance "Doutor Vampiro" (1921); "Violetas" (1922), "Cavalinho Branco" (1930) e "Palácio das Três Estrelas" (1930), entre outros. Em co-autoria com o arqueólogo e escritor, Manuel Vieira Natividade e Virgínia Vitorino, escreveu a peça Inês. Escreveu ainda o texto da ópera Vagamundo, musicada em épocas diferentes. Recebeu a Ordem de Benemerência, pela sua dedicação às crianças e com a de Santiago da Espada.

 Tem um busto e uma rua a si dedicados, em Vila Real de Santo António.

 

 

 

 Luís Melo e Horta

Presidente da Mesa da Assembleia Geral do

Elos Clube de Tavira

publicado por Henrique Salles da Fonseca às 07:21

Outubro 26 2010

 

 

João Lúcio

 

Sensações desconhecidas

 

Há tanta sensação que não conheço,

tanto vibrar de nervos que não sinto;

e, contudo, parece que os pressinto,

apesar de ver quer os desconheço

 

A sensação que tem, à noite, o ar,

Quando o orvalho o toca, aos beijos de água

é, porventura, irmã daquela mágoa

que sente, quando chora, o meu olhar?!

 

Tem, porventura, alguma semelhança

a sensação de um cravo numa trança

com a ânsia de quem morre afogado?

 

E fico-me a pensar: que sentirá

uma vidraça quando a luz do sol lhe dá

e a rasga a mão da luz, de lado a lado?...

 

___________________________________

 

João Lúcio Pousão Pereira, (Olhão, 4.Julho.18810; 26.Outubro.1918) vulgarmente relegado para a categoria de poeta local, mas especialmente devido à sua obra O Meu Algarve, esteve, porém, à altura dos grandes nomes da Renascença Portuguesa, embora o seu voluntário afastamento dos grandes centros culturais do país tenha contribuído para tais definições limitadoras.

 

Começou com apenas 12 anos a publicar os seus primeiros versos (no extinto periódico O Olhanense). Enquanto estudante no Liceu de Faro, fundou e dirigiu um jornal literário intitulado O Echo da Academia. Foi depois para Coimbra estudar Direito, onde conhecerá e se tornará amigo de figuras brilhantes como Teixeira de Pascoaes, Augusto de Castro, Alfredo Pimenta, Afonso Lopes Vieira, Fausto Guedes Teixeira e Augusto Gil. João Lúcio colabora com poesias suas em diversos jornais e revistas literárias nacionais (fundando inclusive, em 1899, um quinzenário intitulado O Reyno do Algarve), até conseguir, em 1901, publicar o seu primeiro livro, Descendo, aclamado com louvor pela crítica da época.

 

Regressando a Olhão em 1902, João Lúcio torna-se um advogado famoso, dados os seus dotes argumentativos e orais. As salas de tribunais enchiam, e ainda hoje, é considerado como um dos mais distinguidos advogados algarvios de sempre.

 

É então que o poeta, monárquico, se torna editor literário do semanário farense O Sul, jornal ligado ao Partido Regenerador Liberal de João Franco, em cujas listas concorre e ganha um lugar, em 1906, para a Câmara dos Deputados, e foi, embora num curto período, Presidente da comissão administrativa da Câmara Municipal de Olhão. Entretanto, em 1905, publicara O Meu Algarve, obra que acaba por imortalizar João Lúcio como um dos maiores vultos da poesia algarvia.

 

Com a instauração da República, o poeta abandona a política e decide viajar com a sua família pela Europa, tendo publicado, em 1913, Na Asa do Sonho. Provavelmente inspirado pelas suas viagens, João Lúcio projecta então um chalé completamente original, no isolamento dos Pinheiros de Marim, nos arredores de Olhão, para onde pensava retirar-se depois de abandonar a advocacia, a fim de buscar a inspiração para a sua poesia.

 

O isolamento espiritual numa Torre de Marfim seria a finalidade do poeta, que teria mandado construir o chalé entre 1914 e 1916. Actualmente, o chalé serve de instalações à Ecoteca de Olhão, conservando alguns objectos pessoais do poeta e documentação variada.

 

 Em 1914, o poeta aceitava o convite de Teixeira de Pascoaes, para se associar à Renascença Portuguesa, tendo publicado um único poema na revista A Águia.

 

Em Agosto de 1918, João Lúcio decide ir habitar o chalé com a sua família, apesar de este se encontrar ainda inacabado. É aí mesmo que vem a contrair o fatídico vírus da pneumónica que assolou a região, e que lhe acabaria por ceifar a vida com apenas 38 anos de idade.

 

Postumamente, em 1921, foi publicado o livro de poemas Espalhando Fantasmas.

 

Luís de Melo e Horta

publicado por Henrique Salles da Fonseca às 20:08

Outubro 19 2010

 Júlio Dantas (1876 - 1962 ...

 Júlio Dantas

 

A LIGA DA DUQUESA

 

A senhora duquesa, uma beleza antiga,

de bastão de faiança, de cabelo empoado,

certo dia, ao descer do seu estufim dourado

sentiu desapertar-se o fecho de uma liga.

 

Corou. Quis apertá-lo (ao que o pudor obriga),

mas, voltou-se, olhou... Tinha o capelão ao lado.

Mais um passo e perdeu-se o laço desatado,

e rebentou na corte uma tremenda intriga.

 

Fizeram-se pregões. Marqueses, condes, tudo

procurava, roçando os calções de veludo

por baixo dos sofás, de joelhos pelo chão...

 

E quando já ninguém mais esperava - que surpresa! -

foi-se encontrar por fim a liga da duquesa

no livro de orações do padre capelão.

 

Do livro: "Sonetos" (1916) , in Líricas Portuguesas

 

______________________________________________________________________

 

Júlio Dantas (Lagos, 19.05.1876 - Lisboa, 25.05.1962) foi médico, poeta, jornalista, político, diplomata e dramaturgo. Filho de Casimiro Augusto Vanez Dantas, militar, escritor e jornalista, e de Maria Augusta Pereira d'Eça, estudou no Colégio Militar, em Lisboa, inscrevendo-se seguidamente no curso de Medicina da Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa, que concluiu em 1900. Foi oficial médico do Exército a partir de 1902.

 

A carreira de medicina militar, onde optou pela psiquiatria, não o absorveu. Dedicou-se simultaneamente à literatura e a uma intensa actividade intelectual e social, que o tornou conhecido nos meios políticos e nos círculos cultos de Lisboa. Foi deputado às Cortes em 1905.

 

Na literatura revelou-se um verdadeiro polígrafo, dedicando-se aos mais variados géneros literários. Alcançou grandes êxitos com as suas peças teatrais, com obras como A Severa, A Ceia dos Cardeais (traduzida em mais de 20 línguas), Rosas de Todo o Ano e O Reposteiro Verde.

 

Nas suas obras defende o culto do heroísmo, da elegância e do amor, situando a trama quase invariavelmente no século XVIII, época que escolhia como cenário das suas produções, salientando a decadência da vida aristocrática da época. É também comum encontrar a exaltação do efémero, da morte e do sentimentalismo mais pungente. A sua obra poética é claramente inspirada na lírica palaciana do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende.

 

Foi considerado retrógrado por alguns, como foi o caso de Almada Negreiros que lhe dedicou o Manifesto Anti-Dantas. Foi Presidente da Academia de Ciências de Lisboa, presidente do Conservatório Nacional, Ministro da Instrução Pública, Ministro dos Negócios Estrangeiros (1921-1923) e embaixador no Brasil (1941-1949). É de destacar o seu papel na elaboração de um acordo ortográfico com o Brasil.

 

Obra - Poesia :- Nada (1896) ; Sonetos (1916)

Teatro: O Que Morreu de Amor (1899); Viriato Trágico (1900); A Severa (1901); A Ceia dos Cardeais (1902); Paço de Vieiros (1903); Um Serão nas Laranjeiras (1904); Rosas de Todo o Ano (1907); Auto de El-Rei Seleuco de Camões (1908); Soror Mariana (1915); O Reposteiro Verde (1921); Frei António das Chagas (1947).

Prosa: - Outros Tempos (1909); Figuras de Ontem e de Hoje (1914); Pátria Portuguesa (1914); O Amor em Portugal no Século XVIII (1915); Abelhas Doiradas (1920); Arte de Amar (1922); Cartas de Londres (1927); Alta Roda (1932); Viagens em Espanha (1936); Marcha triunfal (1954).

Traduções: - Rei Lear, de William Shakespeare, Cyrano de Bergerac, de Edmond Rostand.

 

  Luís Horta

Presidente da Mesa da Assembleia Geral do

Elos Clube de Tavira

publicado por Henrique Salles da Fonseca às 16:07

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