António Aleixo
QUADRAS
Veio da serra p’ra cidade,
Vender sêmea por farinha…
Passado uns anos já diz:
-“Esta rua é toda minha!”
Tu não vais à procissão
P’ra rezar à Virgem Mãe.
Tu vais, para os que lá vão
Verem que tu vais também
Que importa perder a vida
Em luta contra a traição,
Se a Razão, mesmo vencida,
Não deixa de ser Razão.
Sei que pareço um ladrão,
Mas há muitos que eu conheço,
Que sem parecer o que são,
São aquilo que eu pareço.
Vós que lá do vosso Império
Prometeis um mundo novo…
Calai-vos que pode o povo
Qu’rer um Mundo novo a sério.
(In “Este livro que vos deixo”)
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A quadra popular é cultivada um pouco por todo o País e ainda tem entre os menos jovens, muitos dos que a defendem com a garra e os conhecimentos que têm. Estes, às vezes poucos, o que não impede de apresentarem trabalhos muito interessantes e oportunos.
António Fernandes Aleixo (N.Vila Real de Santo António – 18.02.1899; F. Loulé 16.11.1949) podia ter sido apenas mais um poeta popular. Mas não o foi só. Não teve vida fácil.
Tecelão, servente de pedreiro em França, pastor e cauteleiro, andou sempre em movimento, de terra em terra, e dos seus versos emana uma certa amargura e desencanto. Mas se essa amargura não esconde que está “de pé atrás” perante o mundo que o rodeia, também mostra que tem das pessoas e das personagens, uma sábia visão e uma critica que nem por ser cáustica, deixa de possuir um conteúdo muito real e muito concreto.
Dois momentos fazem com que a sua obra se não tenha dispersado. Em Coimbra, onde esteve por doença pulmonar, encontra um incompreendido artista plástico algarvio – Tossan – com quem priva durante a permanência de ambos no Sanatório. Mais tarde e já no Algarve, e através de Tossan, é o Dr. Joaquim Magalhães, saudoso professor do Liceu de Faro quem assume o trabalho de guardar e normalizar toda a produção poética.
Vinte anos depois da sua morte e através dos seus descendentes é publicado “Este livro que vos deixo” e em 1978 “Inéditos de António Aleixo”.
Além de ruas com o seu nome em muitas localidades do Algarve, em Loulé, num dos Cafés da Avenida Costa Mealha está uma estátua do Poeta, na esplanada, como se estivesse ainda a vender a suas cautelas da lotaria.
Luís Maria de Mello e Horta
Presidente da Mesa da Assembleia Geral do
Elos Clube de Tavira