Elos Clube de Tavira

Julho 02 2010

 

 

Entrevista do Presidente da

Associação Cultural Além Guadiana

ao «Café Portugal» em 29-06-2010

 

http://www.cafeportugal.net/pages/noticias_artigo.aspx?id=2284

 

Parte 1

 

Olivença, 5 de Junho de 1954 Também um burgo pode ter saudades e mirrar-se de melancolia. Há um espírito de exílio nos lugares, perfeitamente igual ao dos indivíduos. Que pena me fez a esfera armilar no “ayuntamiento”, murcha, introvertida, apertada em novelo como uma flor de luto!

Miguel Torga (Diário, vol. VII)

 

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Em Olivença «o português pertence ao mais profundo da nossa cultura» Para o Presidente da Associação Além Guadiana, cujo objectivo é dinamizar a cultura portuguesa em Olivença, com o passar do tempo as ancestrais ligações» com o nosso país «começaram a perder-se». Joaquín Fuentes Becerra refere que «a melhor maneira de recuperar os caminhos perdidos, entre eles o da língua, é através dos sentidos, das emoções, dos pequenos e grandes descobrimentos da nossa história desconhecida e dos novos laços com Portugal». «Não podemos ter duas culturas se uma delas não se pode expressar através das palavras, só das pedras mudas», lamenta Becerra, considerando que é fundamental apostar no ensino da Língua aos mais jovens.

Ana Clara | terça-feira, 29 de Junho de 2010

 

Café Portugal – Em Junho último a Associação a que preside organizou um dia de homenagem à Lusofonia em Olivença. No fundo, um dia de memória à língua portuguesa que contou com o apoio do Ayuntamiento de Olivença. Gostaríamos que pormenorizasse.

 

Joaquín Fuentes Becerra – A Além Guadiana tem tido sempre uma boa e aberta relação com a autarquia e os diferentes representantes políticos de Olivença. Após a criação da Associação em Março de 2008, apresentámo-nos a todas as instituições culturais e políticas locais com o objectivo de explicar o sentido da Associação, os nossos fins e actividades a desenvolver. Apesar de ser uma entidade jovem, com pouco mais de dois anos, temos desenvolvido um grande número de actividades, como as primeiras Jornadas sobre o Português Oliventino, a criação de um website e um blogue para a difusão da Além Guadiana e a cultura lusófona, eventos musicais, etc. Tudo sempre em linha com a cultura portuguesa e com uma grande aceitação popular. Depois, chegaram outras iniciativas como a recuperação dos velhos nomes das ruas em português ou a realização de um espaço dedicado ao mundo lusófono, o «Lusofonias». Ambos os projectos foram apresentados à Câmara e às instituições políticas de Olivença e contaram com um apoio unânime. Também temos desenvolvido actividades em colaboração com os professores de português da escola «Francisco Ortiz» para a divulgação do português que se fala em Olivença. Estas iniciativas não teriam sido desenvolvidas sem a participação directa das instituições oliventinas, sendo indicativas de uma grande receptividade. Para a nossa Associação, são muito importantes os canais de comunicação locais, bem como o envolvimento da população oliventina nos diferentes projectos. Não teria sentido promover actividades sem conexão com a povoação. E se o temos conseguido, até agora, é pela nossa maneira altruísta de contribuir para o desenvolvimento cultural, pela forma sempre construtiva de apoiar iniciativas, pela visão integradora das nossas propostas, pela desvinculação política da nossa actividade e pelo interesse colectivo dos próprios projectos. A iniciativa de recuperação dos nomes ancestrais das ruas em português foi mais um exemplo, pois foi exposta com uma visão didáctica, cultural e turística com um elevado simbolismo.

 

C.P. – Olivença está há dois séculos sob administração espanhola. De que forma, hoje, os oliventinos se mantêm ligados a Portugal?

 

J.F.B. – Para além das fronteiras políticas estão os espaços culturais. Até meados do século XX, século e meio após a mudança de nacionalidade, Olivença tinha culturalmente maiores semelhanças a Portugal do que a Espanha, no âmbito linguístico, etnográfico, das tradições. Nessa altura nasceram os últimos luso falantes e desde então houve um processo mais rápido de debilidade das raízes culturais. A realidade da Olivença de hoje é diferente da realidade de há cinquenta ou cem anos. Porém, actualmente os oliventinos em termos gerais olham de maneira positiva para o seu passado e, embora os mais jovens não tenham vivido a cultura portuguesa da mesma forma que os pais, olham para Portugal com uma crescente curiosidade, com menos complexos e maior abertura. Este aspecto é novo, pois as gerações anteriores, por razões complexas, olhavam para Portugal com uma maior distância e alguns preconceitos. Pessoalmente, penso que a mudança identitária de Olivença foi um processo longo e complexo. Apesar das emigrações, a maior parte da população oliventina ficou em Olivença depois de 1801 mantendo fortes laços pessoais, culturais e sentimentais com Portugal. Com o passar dos anos, as ancestrais ligações com Portugal começaram a perder-se e os oliventinos tiveram de iniciar a construção de novas ligações com Espanha e criar novas referências culturais. Ainda que os oliventinos tenham consciência do passado português, foi muito o que se perdeu no caminho.

 

C.P. – Como se pode recuperar esse muito que se perdeu?

 

J.F.B. – Na Associação Além Guadiana, achamos que a melhor maneira de recuperar caminhos perdidos é através dos sentidos, das emoções, dos pequenos e grandes descobrimentos da nossa história desconhecida e dos novos laços com Portugal, degustando a sua gastronomia, conhecendo as suas paisagens e povos, fazendo novas amizades, conversando em português além e aquém Guadiana. Recentemente, no âmbito do primeiro certame das «Lusofonias», teve lugar uma Leitura Pública Contínua em Português, onde numerosos oliventinos de todas as idades, incluindo os representantes de todos os partidos políticos, leram textos de Camões, Pessoa, Saramago, Florbela Espanca e outros expoentes das letras portuguesas, incluindo quadras tradicionais de Olivença e autores oliventinos como Ventura Abrantes ou Caetano da Silva e Soutomaior, poeta oliventino do século XVIII conhecido como o Camões do Rossio. Foi um acto sem precedentes, popular e emotivo, que mostra grande abertura e novas maneiras de olhar a Portugal.

 

(continua)

 

Colaboração do Dr. António Marques, anterior Presidente do Grupo dos Amigos de Olivença

publicado por Henrique Salles da Fonseca às 09:13
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